– Deva, ainda é você que revisa o
boletim da igreja?
Faço essa revisão desde 2004, e,
como sou bem vivido, percebi logo o que viria a seguir. Respondi:
– Sim, mas eu também erro. Qual
foi o erro que você encontrou?
Essa pessoa é a mesma que, anos
atrás, discutiu comigo insistindo que a frase “eu devia ter trago um
lanche” estava correta. Para minha grata surpresa, ela evoluiu muito, e, desta
vez, realmente tinha razão. Ou pelo menos meia razão. Vejamos.
Então ela falou:
– Na frase “Mas ser santo é
aspirar ser coerente”, devia ter um “a” depois de “aspirar”, pois esse verbo
com o sentido de querer, desejar, pretender, é transitivo indireto, exigindo
uma preposição.
Como se tratava da bela Amanda,
uma jovem com a qual tenho excelente relacionamento, brinquei:
– Discordo. Mas não afirmo
categoricamente. Vou pesquisar e depois te mostro.
Pesquisei e, realmente, Amanda
tinha meia razão. Congratulations,
dear Amanda.
Vejam o que diz o dicionário
Aurélio Século XXI, na acepção número seis do verbete aspirar (sublinhados
meus):
V. t. i.
6. Desejar ardentemente;
pretender: "Minha alma, ó Deus, a
outros céus aspira" (Antero de
Quental, Sonetos, p. 188); "Aspiro a ser puro e não a ser
purista." (Manuel Odorico Mendes,
Ilíada de Homero, p. 37); "Sente o sol muito longe, sente a claridade no
ar que rareia. E toda a noite aspira pela luz." (Raul Brandão, A Farsa, p. 152).
[Não admite o
pronome lhe(s), mas apenas as f. analíticas a eles, a elas: "E a mim, que aspiro a ele [Deus], a mim, que o
chamo, / Que anseio por mais vida e maior brilho, / Há de negar-me o termo
deste anseio?" (Antero de Quental,
Sonetos, p. 187); É honraria muito cobiçada, e no entanto a ela não
aspiro. ]
Mas ... por que só meia
razão? Acontece que, quando ao verbo aspirar se seguir outro verbo na forma
infinitiva, a preposição poderá ser omitida. Conforme explica o professor
Dilson Catarino:
“É que modernamente o verbo
aspirar, no significado de ter um objetivo, pretender, pode ser usado sem
preposição alguma quando seguido de outro verbo no infinitivo (verbo terminado
em –ar, -er ou –ir). Há, portanto, duas possibilidades:
- Aspiro a ser um grande escotista.
- Aspiro ser um grande escotista.”
Então, Amanda, empatamos. Mas já
vejo o dia em que você me substituirá na revisão do boletim da IPJ. Essa era
uma preocupação que eu sempre tive: quem, depois de mim? Considere-se eleita minha
seguidora.
Ah, o título deste post! É uma homenagem à música de mesmo
nome, de Lupicínio Rodrigues. Pode ser encontrada por aí, na internet.
Devanir Nunes
ultima-flor-do-lacio.blogspot.com.br
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Legal esse post :) Não sabia que o "a" era opcional.
ResponderExcluirEu também não. Quando a Amanda falou, senti que ela estava certa. Mas a experiência (intuição, proporcionada pela lembrança de muitos livros lidos) estava a me incomodar (como diriam nossos irmãos d'além mar), levando-me à pesquisa e à conclusão de que as duas formas estão corretas.
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